terça-feira, 13 de agosto de 2013

Mandrágora: uma plantinha cheia de mistérios.

Quem não se lembra da Professora Sprout, de Herbologia, a pegar numa mandrágora que guinchava sem parar? Entre as páginas do livro “Harry Potter e a Câmara dos Secréta”, de J.K.Rowling e de obras como “Romeu e Julieta” de William Shakespeare ou até em imagens de filmes como “Labirinto de Fauno”, de Guillermo Del Toro, a mandrágora está presente e desperta curiosidade em quem a vê. De nome científico mandragora officinarum L., a mandrágora é uma planta, em tempos considerada medicinal, cuja história é longa e povoada de lendas, que envolvem as civilizações hebraica, grega e romana.  
A sua lenda e as caraterísticas peculiares levaram a que Carla Lixa, professora de Biologia do Ensino Básico e Secundário, decidisse explorar este tema, no âmbito do Doutoramento em Ensino e Divulgação das Ciências, da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, através de um trabalho de pesquisa para a disciplina de Epistemologia e História das Ciências, Módulo de História da Biologia.
“A mandrágora é uma planta perene e que tem uma grande raiz principal, bifurcada e muito ramificada e que por vezes adquire a forma humana. As folhas têm 30 centímetros e são verde-escuras, ovadas, basais e as flores são de cor amarela ou púrpura”, explicou ao Ciência 2.0. Os frutos por ela originados são carnosos e de cor amarela, sendo aromáticos e tóxicos. Foram apelidados pelos árabes como “as maçãs do diabo”, por terem propriedades consideradas afrodisíacas.

A mandrágora, planta que tem várias espécies e não apenas a referida, pertence à família botânica Solanaceae, é conhecida na história de várias civilizações por diversos nomes. A sua nomeclatura foi evoluindo ao longo dos anos, até que o nome científico que conhecemos hoje – Mandragora officinarum L. – foi dado pelo botânico sueco Carl von Linné (em Português, Carlos Lineu), que criou a chamada nomenclatura binomial.
O nome mais abrangente desta planta, de acordo com o trabalho de Carla Lixa, provém do inglês, “mandrake”, ou seja, por um lado homem, devido à raiz que parece ter uma forma humana, por outro o “drake”, derivado de dragão, que faz alusão aos poderes mágicos.
Mandrágora e os efeitos alucinógenios
Acreditava-se que a mandrágora tinha poderes mágicos, tendo sido associada muitas vezes a rituais de bruxaria, e que servia como tratamento, por exemplo, para a infertilidade. Ao longo de vários séculos, autores clássicos, como Sócrates, Demóstenes, Macróbio e Teodoreto, escreveram sobre as propriedades soníferas e anestésicas desta planta.
A mandrágora foi considerada por várias civilizações como tendo propriedades medicinais, narcóticas e afrodisíacas, segundo nos conta Carla Lixa. A doutoranda revela ainda que hoje em dia existem vários estudos que fundamentam a presença de elementos químicos alcaloídes  que concedem propriedades alucinogénias à mandragora officinarum L.  De acordo com Rubim Almeida, docente de Biologia da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, consultado pelo Ciência 2.0, todas as mandrágoras "contêm alcaloídes (atropina, escopolamina, etc) que provocam delírios e outros efeitos hipnóticos e depressivos que podem causar muitos outros sintomas como bradicardia, delírios, vómitos e morte".
“De certo modo a mandrágora começa a surgir como uma planta associada a tratamentos. Antigamente, transpunha-se a forma da planta para aquilo que ela tratava, se tinha a forma de rim, tratava os rins, como a mandrágora era a planta que tinha uma raiz de forma humana, então achavam que curava tudo”, explica Carla Lixa. 
“A planta lançava um grito que enlouquecia aquele que o ouvisse”
Teofrasto, filósofo grego que escreveu o primeiro tratado sobre plantas, contou, no livro "Enquiry Into Plants II" a história da lenda das mandrágoras que passamos a citar: “O herborista só o poderia fazer à noite. Primeiro, teria de se inclinar em direção do sol poente e homenagear as divindades infernais, isto é, as forças telúricas. O produtor deveria desenhar três círculos ao redor da planta com a sua espada de ferro virgem. Então, de frente para o oeste para evitar feitiços, ele deveria cortar porções das raízes secundárias. Em seguida, não deveria proceder pessoalmente à colheita pois, no momento em que era arrancada, a planta lançava um grito que matava ou enlouquecia aquele que o ouvisse. Por isso, depois de ter cuidadosamente tapado os ouvidos com cera, o herborista amarrava um cão à planta e atirava-lhe um pedaço de carne um pouco além do seu alcance. O cão corria e caía morto. Mas a mandrágora estava arrancada. Uma colheita tão perigosa merecia uma grande retribuição. Mas que importância tinha, já que a mandrágora reembolsava largamente seu comprador. Bastava fechá-la num cofre para que ela dobrasse o número de moedas que ele continha”.

Embora a mandragora officinarum L. tenha sido descrita como originária da Península Ibérica, "os últimos estudos taxonómicos apontam que na Península Ibérica todas as plantas de mandrágora pertencem à espécie Mandrágora atummalis[mandrágora mediterrânica],realça Rubim Almeida. Existe, assim, uma única espécie de mandrágora em Portugal.
Atualmente, apesar de estas plantas terem sido muito usadas a nível medicinal, não há conhecimento, segundo o docente, de nenhum medicamento feito a partir delas. 

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